domingo, 28 de março de 2010

O nascimento de uma flor


1. A cor que grita: Esperem por mim




Estava eu toda verde quando passou a manhã e veio a tarde. Revesti-me de exuberância e multipliquei o prazer de me ver assim! O vento roçava-me com ternura sem saber, o sol beijava-me morno e o dia avançava com o respirar de todas as coisas vivas.
Eu também estava viva! Sentia que sempre o estivera. Mas agora a força que me animava era outra, mais material e mais física, fazia-me agarrar ao mundo onde estava! Projectei a minha sombra no chão e vi como a dimensão dela fazia uma curva diferente.
Um bando de pássaros passou por ali. Conversámos longamente sobre primaveras vividas antes e eles trouxeram consigo as lembranças de ninhos em escarpas frígidas.
- Ter asas e voar é mais do que uma função, não é? - Perguntei eu.
Um dos pássaros olhou para mim enquanto catava a base das asas e respondeu-me:
- Quando voamos vemos o mundo e aprendemos com ele. Que conheces tu dele e dos seus contrastes? Dos desertos e das florestas, dos céus e dos mares, dos campos e das cidades? Só conheces o perímetro de ti mesma…
- Eu não preciso de asas para aprender sobre o mundo, ele vem até mim através das emoções dos outros, de maneira intocável é certo, pois estou presa à terra, mas repara, como se ergue a minha cor para além do solo! Aprendo o mundo através dos elementos que vêm até mim.
- Nesse caso tudo o que aprendes vem travestido, não é autêntico, vem transformado pela percepção dos outros… que tens realmente de teu no teu conhecimento?
- Tudo! Eu pertenço a este todo e partilho-o sem medo de perder o meu poder. Para que me serviria o teu conhecimento? A tua sabedoria serve para dominar, eu porque comungo da vida, desejo apenas estar viva e ser feliz.
O pássaro pareceu não concordar comigo e para mostrar todo o seu poder, convidou o bando a um voo uníssono e levantaram-se do chão formando uma nuvem anónima pelo céu.
De facto esqueci-me de lhe dizer que pensar individualmente era importante mas não evitava que eles agissem assim sincronizada e impessoalmente. Eu ao menos, oferecia-me de forma única. E isso era o mais importante.
Perdoando-os, ainda lhes gritei:
- Ei! Esperem por mim! Levem o meu verde pelo mundo fora!

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